Ambiente e Sustentabilidade

Entrevista a Diogo Pinho, do Monte Silveira: “Para o produtor, as leguminosas têm um papel muito positivo na saúde do solo. Para os consumidores, haveria mais diversidade e equilíbrio alimentar.”

As leguminosas têm o potencial para ganhar mais protagonismo no panorama agrícola português, não apenas pelo seu valor nutricional e económico, mas também pelo papel essencial que desempenham na regeneração dos solos e na promoção da biodiversidade.

Para a Herdade Monte Silveira, com mais de 700 hectares e uma referência nacional e internacional situada na Beira Baixa, estas culturas assumem um papel importante e estratégico. “No Monte Silveira, as leguminosas desempenham um papel vital nas práticas agrícolas regenerativas da herdade, contribuindo para a saúde do solo, a rotação de culturas e a resiliência geral do ecossistema.”, lê-se no website da Herdade.

Para compreender melhor o impacto e os desafios associados à produção de leguminosas, entrevistámos Diogo Pinho, Diretor de Investigação, na Herdade Monte Silveira. Especialista em microbiologia do solo e biotecnologia, Diogo partilha o compromisso do Monte Silveira e uma visão sobre o presente e o futuro das leguminosas na agricultura portuguesa.

Um homem sorridente com um suéter creme está em frente a plantas verdes exuberantes e palmeiras altas, com a luz do sol passando por uma estufa de vidro ao fundo.

As leguminosas têm múltiplos papéis. Entre eles, são importantes para o consumo humano, onde conseguimos maior rentabilidade, e são fundamentais para a rotação de culturas. Trabalhamos sempre com duas culturas em conjunto, e as leguminosas trazem retorno financeiro, mas também muitos serviços ao ecossistema: ajudam na fertilidade e estrutura do solo, atraem polinizadores e protegem a biodiversidade. Produzimos em modo biológico e regenerativo, com certificação ROC, o que valoriza ainda mais o produto.

Sim, vários. Por exemplo, a produção pode ser baixa, principalmente com algumas variedades. Além disso, no mercado internacional não conseguimos competir em preço com determinados países. Também enfrentamos dificuldades no escoamento de algumas variedades de leguminosas (como aconteceu com o feijão catarino, no passado). Para responder a estes desafios, o Monte Silveira tem apostado em verticalizar a exploração, não ficando só com o produto em bruto e venda a granel. Muito brevemente, também teremos produtos finais como leguminosas em conserva, tremoço transformado ou húmus de grão-de-bico. Isso ajuda a aumentar o preço e a margem. Acresce que somos a primeira exploração em larga escala com certificação ROC, o que nos dá uma vantagem na rentabilidade. Outro ponto importante, em termos de desafios, é o pós-colheita, como máquinas que separam os grãos por tamanho (mesa vibratória) ou que fazem a limpeza . Isto aumenta a qualidade do produto. Mas, para alguns produtores, talvez faça mais sentido partilhar estes investimentos ou recorrer a serviços externos especializados.


A curto prazo, o apoio público pode ser útil. Mas é essencial que a indústria assuma um papel mais ativo e um compromisso com os produtores de leguminosas. É preciso trabalhar em conjunto: agricultores, indústria e consumidores. Outro ponto fundamental é o acompanhamento técnico. Seria muito útil termos roteiros técnicos que guiassem o produtor desde a sementeira até à colheita e pós-colheita. A ANPOC já faz formação anual e acompanhamento mensal (análises de solo, estimativas de produção, etc.), mas ainda falta apoio técnico mais direcionado e consistente para as leguminosas.


Seria benéfico para todos. Para o produtor, as leguminosas têm um papel muito positivo na saúde do solo. Para os consumidores, haveria mais diversidade e equilíbrio alimentar (mais promoção da proteína vegetal). E este aumento de produção e procura poderia dinamizar as comunidades rurais e fortalecer as cadeias de valor. Acresce que as leguminosas integram-se muito bem no conceito One Health (Uma Só Saúde), que liga a saúde humana, animal e ambiental. Apoios públicos e uma indústria comprometida seriam a ponte entre boas práticas agrícolas e benefícios diretos para o consumidor.

Comparando com outras culturas vegetais, as leguminosas são atrativas. O tremoço pode ter boa rentabilidade, embora seja instável: no ano passado foi um desastre, mas este ano a produção foi muito boa, especialmente em consociação com a aveia, onde uma cultura ajudou a outra. O grão-de-bico é menos apelativo, porque a produção é baixa e não conseguimos competir em preço com o importado. O feijão-frade tem baixa manutenção e, apesar de ocupar menor área, gera boa rentabilidade por hectare. No fim, tudo se resume ao custo-benefício de cada hectare: escolher a cultura que maximize a rentabilidade. Também é importante ter acordos prévios com a indústria, mas isso nem sempre é fácil porque competimos com importações. Se tivermos melhor acompanhamento técnico e conseguirmos aumentar a produção por hectare, podemos começar a competir em escala com países lá fora.



Reforçar que falta aconselhamento técnico especializado. Roteiros ou itinerários técnicos ajudariam bastante os produtores, sendo que cada leguminosa tem exigências diferentes. Por exemplo, o grão-de-bico é mais frágil, enquanto a fava é mais resiliente. E a questão económica continua a ser um desafio. Seria importante haver mais investigação aplicada e apoio pós-colheita, sobretudo no setor biológico.

Sobre Diogo Pinho:

Diogo Pinho é especialista em microbiologia do solo e biotecnologia, com experiência em investigação científica e gestão de projetos. Com formação académica em Biotecnologia e um doutoramento em Biologia Molecular e Microbiologia do Solo, acumulou experiência como investigador e gestor em várias instituições, incluindo Biocant Park em Cantanhede (2011-2019), Forest Research no Reino Unido (2016-2019), Biome Makers nos EUA e Europa (2019-2021) e, ainda, no Food4Sustainability CoLAB (2021-2022). Atualmente, é Diretor de Investigação, na Herdade do Monte Silveira, onde gere e otimiza práticas agrícolas e coordena os projetos de investigação e inovação focados em agricultura regenerativa, saúde do solo, biodiversidade e serviços do ecossistema. Autor de 12 publicações científicas e com mais de 50 palestras em conferências, participa atualmente em 16 projetos nacionais e internacionais.

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